segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Doutor Sócrates e o Infinito

Quando a camisa 8 entrava em campo, o gramado virava tapete para o desfile de um dos jogadores mais fabulosos que o mundo já viu jogar. Espetacular dentro das quatro linhas e revolucionário fora delas.  Na liderança de idéias visionárias para a gestão esportiva da época, fundou a sua própria democracia  e de seus companheiros. 

Na companhia rebelde de Casagrande e suas fulminantes investidas ao gol, de Biro-Biro e suas vigorosas arrancadas de meia arriada, da elegância jazzística de Vladimir e das milimétricas viradas de jogo de Zenon. De tantos talentos que reverenciavam à maestria de um gênio. Um gênio de passadas largas e trote medieval, passes precisos e calcanhar cirúrgico, gols fabulosos e comemorações de punhos cerrados como os Panteras Negras.

Com o manto Canarinho em 82, formou com Zico, Falcão, Cerezo, Júnior, Éder, Leandro e tantos outros artistas da bola, o melhor escrete de futebol que já vi desfilar pelos gramados do mundo. Comandados pelo Mestre Telê levaram todo o país às lágrimas, provando que esporte pode estar muito perto da arte, quando executado por imortais. O fato é que Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira poderia receber esse título.

Quis o destino que, quando saiu do país, fosse para a Fiorentina. Time da cidade de Florença, berço do Renascentismo Italiano. Mas a terra de Dante Alighieri e cenário de obras de Michelangelo, da Vinci, Botticelli, Rafael e Donatello não foi futebolisticamente digna de seu talento e logo voltou ao país, para anos depois se aposentar e cair nas armadilhas inebriantes que levaram ao seu fim. Quando deitamos o número 8, surge o símbolo do infinito. Com a última queda do Doutor Sócrates, eternizasse a imagem de um homem que fez história e em tempos onde o futebol é cada vez mais marketing do que talento, parece que foi embora um pedaço de nós. Um daqueles pedaços bons.

Obs: Mesmo tantos dias depois de seu falecimento, não poderia fazer o Capim retornar sem prestar essa singela homenagem a um dos meus ídolos de infância, mesmo não sendo corintiano. Fica em paz Doutor.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O Cheiro do Toque na Orelha

O primeiro contato  é normalmente bem superficial ... despretensioso até mesmo. Às vezes, baseando-se apenas nas aparências, a atração começa pelas capas. Coloridas, ousadas e criativas como os anos loucos dos gênios ou monocromáticas e minimalistas como o Álbum Branco, compensando a ausência de pigmentos pela profundidade de seu conteúdo.

Mas quem vê capa não vê coração. Corações de tantos personagens inseridos em obras nas mais variadas proporções. Desde as pequenas com grandes histórias que cabem no bolso até as maiores que insistentemente não se encaixam nas prateleiras, sempre à procura de novas companhias. Ora magérrimos e elegantes, bulimicamente despejando palavras em nossas mentes, ora grossos e densos encantando gerações com o peso de épicos apaixonantes ou romances apaixonados.

De repente, a era moderna os coloca em xeque, sugerindo seu fim. De um lado, o prazer sensitivo de descobrir seus segredos no dobrar das orelhas, no sustentar do peso das páginas ou cheirando a fragrância de cada palavra grafada no branco fosco das folhas. De outro, o dilema de suas versões digitais: Destruir ou coexistir com seus antecessores? Procurando cumprir a promessa de democratizar o acesso ao conhecimento, podem revolucionar a forma de pensar das novas geraçõesmas a ciência ainda busca seu formato ideal. Versáteis como o escrete de Rinus Michels, portáteis, mágicos e sedutores mas ainda incompatíveis com o saldo de tantas contas bancárias e cruéis inimigos de nossas retinas.

Será mesmo o destino? Depois dos escritos nas pedras, das tábuas de argila, do papiro e da revolução de Gutemberg, serão eles convertidos para 0s e 1s na Grande Rede? Bibliotecas mudarão para as nuvens? Estantes se tornarão diretórios? Números e estatísticas apontam que sim, testemunhos de peso apostam que não. No mês do Dia nacional do livro, deixamos a dúvida mas prestamos nossa homenagem à sua missão, ainda mais grandiosa que sua forma: engrandecer nossas mentes, encantar nossas vidas.


Nota: Aproveitemos o ensejo da data comemorativa e vamos para festa de aniversário. :)



sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Esculpindo em Espelhos


Um latejante princípio de dor de cabeça se antecipa em segundos ao impiedoso ataque sonoro da cigarra disparado pelo assistente de apoio ao ensino. Músculos cansados e reflexos descalibrados pela extenuante jornada de trabalho, já em seu segundo semestre de mais um ano letivo, parecem que dessa vez não irão responder, como em tempos atrás. Ledo engano ... O levantar e juntar dos materiais de trabalho ora espalhados pela velha mesa com marcas de caligrafia faz com que suas forças se manifestem mais uma vez quando o dever os chama.

Suas saídas rumo à sala de aula trazem o ar que faltava para completar a simbiose. Pessoas aparentemente comuns, como outras quaisquer, transvestem-se em arautos da mais nobre das artes. Pegadas, diferentes das demais, traçam velhos caminhos em corredores apertados, barulhentos e de tantas cores quanto os filmes de Almodóvar, gerando vibrações que se misturam a olhares revestidos dos mais variados sentidos em suas direções: Admiração por seus conhecimentos, paixão pela forte presença de espírito, entusiamo por sua eloquência,  gratidão pelos incentivos e tantos outros sentimentos que se dispersam pelo mar de semblantes na multidão.

Segurados ao lado do corpo, livros são seus escudos e pincéis atômicos seus sabres de luz. Armas de defesa no eterno combate do saber contra um cenário de escuridão cada vez mais assombroso e já observado aqui mesmo em posts anteriores. Seus encontros com os quadros, antes negros ou verdes com marcas de giz, agora refletem como espelhos num branco brilhante, a imagem de seus conhecimentos usados como matéria-prima para lapidar novos profissionais e esculpir novas carreiras que serão embasadas por Fayol, Taylor e Ford, Hipócrates, Newton, Aristóteles, TuringJean Piaget e tantos outros nomes de uma lista tão extensa quanto as notas, presenças e diários de aula aguardando cadastro no sistema acadêmico. Universidades, faculdades, cursinhos pré-vestibular, escolas de nível médio e fundamental, aulas para concurso ou de reforço, que antropofagicamente são consumidas por alunos, dispersos em turmas pequenas ou compactamente unidas pela microfonia em auditórios lotados.  Talvez nem saibam eles, são metade do combustível nesse mutualismo tão cheio de dualidades que acaba servindo de principal elemento motivador para guerreiros silenciosos na busca de um mundo melhor, com pessoas melhores, pessoas com educação. De repente, um novo aviso sonoro varre os corredores, agora já vazios, cujas luzes gradualmente vão se apagando ao som do molho de chaves e trancar das portas. Começamos de novo amanhã ...

Essa foi a homenagem do Capim no Meio Fio à mais bela das profissões.
Um Feliz 15 de Outubro. Dia dos Professores.

domingo, 2 de outubro de 2011

Letras na Escuridão

Páginas que agonizam e quase não mais respiram. Há tempos fechadas, sem luz, sem calor ou qualquer tipo de interação, excetuando-se apenas as esporádicas arrumações de prateleira. O paradoxo da alegria e diversidade das capas, de tantas cores e texturas, mas tristemente dispostas no retangular universo das frias e abandonadas estantes, populadas apenas pelos invisíveis moradores que catalizam renite alérgica. A descrição  é da rotina dos livros, revistas e enciclopédias que passam o resto de seus dias nos poucos "sebos" ainda espalhados pelas cidades brasileiras mas bem que poderia ser usada para retratar a atrofia mental de um país e o delinear  de um cenário que se multiplica cada vez mais, sobretudo nas regiões mais pobres e desprovidas de educação: O distanciamento gradual do hábito da leitura.

É bem verdade que existem exemplos que mostram o contrário, tanto de forma aparentemente isolada, mas rapidamente multiplicada pela capilaridade dos blogs e redes sociais, como também em eventos maravilhosos mas elitizados demais e/ou muito distantes (em vários aspectos) do povo em geral.  O abismo intelectual que separa uma minoria do país de sua grande maioria com diferentes graus de analfabetismo é de uma profundidade absurda . E o que ainda é pior: Esse "privilégio" não é apenas daqueles na linha da pobreza. Quantos que tem, tiveram ou terão acesso a uma boa educação não estão nada interessados nessa oportunidade?

A analogia da vida em câmera lenta nos alfarrábios com a estagnação literária que assola tantas gerações não foi usada por acaso nesse BLOG. É de uma assustadora coincidência  que a localização dos principais pontos de venda de livros e revistas usadas da cidade fique justamente nas costas da Assembléia Legislativa do Estado, um local que aqui carinhosamente chamamos de "Paredão". Podemos chamar de cruel ironia mas a luta desses microempresários para continuar seu ofício é tão isolada quanto a importância dada pelos "representantes do povo" à educação do país e o conteúdo das revistas e dvds pornográficos, campeões de vendas nos sebos dos subúrbios brasileiros é tão explícito quanto nossos sentimentos de impotência numa nação cada vez mais refém da política do Pão & Circo. O que fazer? Para onde ir e em qual direção? Continuemos ao menos fugindo do escuro  ... e que os livros sejam nosso farol.

Nesse mês, apesar de não gostar de anunciar assuntos de textos futuros para não gerar um compromisso,  a idéia é que o Capim faça homagens à leitura e a educação, uma vez que outubro é o mês do livro e dos professores. 
Até a próxima então! :)

sábado, 24 de setembro de 2011

Movimento Rápido dos Olhos


R.E.M.
Rapid Eye Movement.
Movimento Rápido do Olhos.
A sigla, que representa a fase mais profunda de nosso sono, quando estamos sonhando de forma mais  intensa possível, foi escolhida no início dos saudosos e brilhantes anos 80 para batizar a banda que, alguns dias atrás anunciou o fim de suas atividades, depois de um contribuição significativa e inesquecível ao pop/rock mundial. A escolha do nome não poderia ter sido mais perfeita, uma vez que é justamente assim que muita gente se sentiu durante todos esses anos escutando as estupendas canções dos talentosíssimos quatro (e depois três com a saída do baterista Bill Berry no fim dos anos 90) músicos Norte Americanos de Athens, Georgia.

É verdade que a banda não termina no seu apogeu criativo. Para mim, apesar de uma lista interminável de clássicos do rock alternativo nos anos 80 e de belíssimos hits produzidos nos últimos dez anos, suas obras-primas ficaram na década de 90, justamente o período que assinaram com uma grande gravadora e se tornaram mais comerciais, para alguns de seus fãs mais antigos. Quem já escutou o som acústico e divino de Automatic for the People (1992), as guitarras distorcidas de Monster (1994), a microfonia de New Adventures in Hi-fi (1996) e a doçura das baladas e letras de Up (1998) deve saber do que estou falando. E olhem que excluí dessa minha lista o trabalho que fez eles famosos para o mundo, lançado justamente nos anos 90. Out of Time (1991) com sua maravilhosa canção, Losing My Religion, de premiado videoclip que abalou o universo pop e os alçou de um status de banda alternativa para rockstars em poucos meses não os impediu de conservar, durante todos esses anos, uma característica interessante e muito típica do R.E.M. Eles sempre serão a banda que conseguia ser alternativa demais para o mundo POP e excessivamente popular para o universo underground. Além disso, sempre foram os caras fotogenicamente incompatíveis com os desejos de boa parte da mídia, frustrando a construção de um caminho de marketing que nunca combinou mesmo com eles. Por fim, diante de tamanha dualidade (que passou a ser até mais um motivo para me identificar tanto com o trabalho do conjunto, vide minha auto-descrição nesse BLOG) e talento, construiu-se a história do REM.  

O fim tinha que chegar ... e chegou.
Mas é o fim apenas da banda. O fim dos belíssimos backing vocals de Mike mills, dos precisos e inspirados acordes de Peter buck e da estupenda presença de palco, liderança e vocais de Michael Stipe, que tive o privilégio inclusive, de um dia ter visto ao vivo em sua última turnê que passou pela Brasil.
Porém, não é o fim do legado que eles deixaram, tanto para seus fãs como para tantas outras bandas influenciadas pelo REM. Ainda podemos contar com Fall on me, Everybody hurts, Drive, Find the river, Leave,  The one i love, At my most beatiful, It´s the end of the world e tantas outras doses de magia.
Basta apertar o play ... e seguir sonhando

domingo, 18 de setembro de 2011

Figuras de Nosso Estado #6

A série que parece nunca ter fim está de volta depois de um hiato de algumas semanas preenchidas por posts sobre outros assuntos, já que o Capim também cresce em outras direções. Para aqueles que moram no bairro da Ponta Grossa, subúrbio de Maceió, não é muita novidade ler algo sobre Lobão. Só que não estou me referindo ao cantor/apresentador e agora também escritor de uma autobiografia que já virou BestsellerNo entanto, além de se parecer fisicamente com o artista carioca, Anivaldo Luiz da Silva, também pode ser considerado um profissional muito polêmico nas atividades que exerce, uma vez que podemos classificá-lo como um performer empreendedor multimídia e não se assustem com o excesso de termos pois é uma tarefa bem difícil adjetivar seus trabalhos.

Lobão é o fundador da Morango Filmes, uma produtora alagoana de filmes pornográficos amadores que já disponibilizou no mercado informal, várias obras de títulos impagáveis (muito regionalistas e que divulgam vários bairros da cidade) mas impublicáveis para esse espaço e que podem ter seus trailers encontrados (para aqueles com uma maior curiosidade antropológica) com muita facilidade na web. Os filmes da Morango não dispõe de muita verba para produção e Lobão conta com um cast de amigos e/ou garotas de programa (digamos, eufemisticamente, de agenda não muito cheia) recrutado, dirigido e filmado por ele mesmo com uma câmera amadora que "eterniza" cenas que, quando posteriormente editadas, são postas para venda por ele mesmo em tablados improvisados na famosa feira Guedes Miranda  ou na clássica praça Deodoro, no centro da cidade.  As vendas de seus filmes, que segundo ele (que leva seu trabalho muito a sério) só não são mais rentáveis por falta de mais recursos financeiros, serve ainda para manter ativo o funcionamento de sua outra empreitada: A posição de líder e vocalista da  já lendária banda de brega-rock alternativo Cheiro de Calcinha. Não é a toa que, ao comprar os DVDs da Morango, o cliente ainda leva de bônus os clipes da banda cujo trabalho já apareceu inclusive no quadro "Garagem" do programa do Faustão.

Além de sua incursão nos extremos das sete artes, Lobão também se aventurou no meio político, concorrendo pelo PSB a vereador de Maceió e conseguindo uma expressiva votação com mais de dois mil votos, que deixou para trás muitos nomes famosos na cena política da cidade. Resposta comum em uma país que acredita cada vez menos na administração pública e tenta se manifestar através de votos de protesto. Ainda assim, foi muito bom Lobão não ter ganho. Ganharíamos mais um político despreparado para perder uma figura que merece um outro destino nesse palco que é a vida. Uso assim das palavras do próprio Lobão em tom profético para encerrar o post e prometer outras figuras em breve:
“Nasci para ser artista e homem do mundo do entretenimento, não vou desistir de jeito nenhum. Ainda irão ouvir falar muito de mim”
Acrescento ainda, para os leitores mais novos do Capim, o convite para visitar os outros cinco personagens da série.
Até a próxima. :)

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Males Crônicos Urbanos #1

Ontem foi comemorado o dia do cliente. Como todos os dias acabamos vivendo esse papel, mesmo que às vezes involuntariamente, é interessante parar para refletir o caminho que a sociedade está tomando no que se diz respeito ao assunto, já que essa é apenas mais uma data comemorativa disfarçada para incentivar algo muito maior.
Desde a geração de cupons de oferta de necessidades não tão necessárias dispostas nos sites de compras coletivas, passando pelos devaneios hipocondríacos dos amantes leitores de folhetos promocionais das farmácias até a farsa das pseudogrifes nas vitrines que vendem muito mais um status do que um produto, vários são os retratos que simbolizam um dos males crônicos  mais presentes do mundo contemporâneo: O consumismo desenfreado.

O locutor raquítico de blusa pólo monocromática com sovacos molhados anuncia no supermercado, por meio de sua voz paradoxalmente aveludada, uma nova oferta relâmpago. Um silêncio de segundos ... todos ouvem atônitos a novidade e a resposta corporal é mais rápida que os reflexos de Usain Bolt. Vamos correr! Está em promoção! É preciso comprar antes que acabe e em casa é que vemos se vai servir. Em outro habitat, não menos hostil, senhoras de meia idade se estapeiam nos grandes varejos de moda têxtil e fazem acrobacias como Jackie Chan para conseguir o metro quadrado daquela peça que está quase de graça e pode servir para costurar o vestido da neta que nem tem tamanho mas já quer mesada e sonha em viver a vida das adolescentes coloridas e vazias das novelas emburrecentes.

A criação de tantas datas comemorativas para se gastar e liquidações coletivas que tentam revitalizar, com crediários tão longos quanto a saga dos Cavaleiros do Zodíaco, a ressaca das compras anteriores diminuem cada vez mais a duração dos intervalos entre os períodos de consumo em massa e tudo parece não ter limites. Se devemos mesmo comprar alguma coisa porque é dia das mães, pais, namorados ou do amigo, o que teríamos que fazer no dia do cliente? Se no dia do professor não é para se lecionar, poderíamos usar o dia do cliente para nada consumir e tirar esse momento para ao menos pensar nessa força invisível, tão poderosa quanto a de Anakin Skywalker, que tanto nos manipula e pode trazer tantos problemas quando mal absorvida. Por fim, estar consciente de que algo pode estar errado já é um começo e fica aqui o recado. É como diria Falcão, em uma de suas várias e  geniais estrofes:

"Eu não tenho culpa se a programação
Tenta a todo custo me tornar um jumento
A ponto de fazer eu passar 36 meses
Pagando a geladeira sem ter o que botar dentro"

Até a próxima compra. Digo ... post. :)

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Desconectando o Gerúndio


Dias atrás, dava início a mais um longo dia de trabalho quando, de repente, a notícia: A INTERNET CAIU!!! Minutos depois, o agravante: Não apenas a grande rede mundial como também todo o funcionamento de smartphones, aparelhos xingling e boa parte da telefonia móvel da cidade estava comprometido. Ainda era cedo e muitos nem haviam tomado café pois deixavam isso pra o ambiente de trabalho ou barracas de caldo de cana nas esquinas e calçadas. Só que nessa altura dos acontecimentos, nada mais importava. A fome, a sede e a vontade de usar escondido o banheiro do chefe, além de outras necessidades da humanidade, eram apenas detalhes sem importância diante do quadro cabalístico de comoção, histeria coletiva e crises de abstinência que começavam a se multiplicar num cenário similar à famosa obra de Saramago

"Não consigo trabalhar assim!!!", gritavam alguns sem nem mesmo notar que raramente acessavam à rede para suas atividades de trabalho. Entretanto, era obsessivamente necessária a onipresença da mesma para "tragadas virtuais" que se alternavam de forma intermitente entre cada tarefa do cotidiano de maneira cada vez mais simbolicamente parecida com as vidas de Neo, Trinty e Morpheus. O cheiro do café já não era mais o mesmo sem o piscar estroboscópico das janelas de bate-papo. A disposição de cores planejadas do escritório estava cinza sem o colorido das fotos expostas nos sites de relacionamento. A dor de não saber se novos emails clamavam para preencher as caixas de entrada era pior que assistir os dois tempos dos jogos da seleção e o colega ao lado já não era mais tão divertido sem ter como garimpar vídeos interessantes do Youtube.

Twiteiros  profissionais, já em estágio terminal desse mal, conectados permanentemente com o gerúndio, viviam a pior situação. Palma das mãos suadas seguravam apreensivamente o smartphone de teclas já borradas pelo excesso de uso. Por quê!?! Por quê!?! , gritavam eles.  Eles não queriam mais informar o que tinham feito ou o que iam fazer. Precisavam desesperadamente dizer o que estavam fazendo. Em tempos em que muitos não conseguem mais ficar desconectados, por um minuto sequer, a pane serviu para refletir o caminho que estamos tomando. Novos tempos, onde o aumento considerável na velocidade, capilaridade e democratização da informação mudou e muda continuamente o mundo e as pessoas. Isso é muito bom, mas também pode ser muito ruim.

Hoje mesmo, é feriado. Só pra variar, está um dia lindo e o nosso mar azul turquesa me chama. Despeço-me para uma caminhada deixando o link de um vídeo divertidíssimo que mostra como seria nossa vida sem internet.
Até o próximo post. 

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Quando parece que vai acabar

Há cerca de uma semana, Marcelo Jeneci, Laura Lavieiri e banda tocaram de forma bem modesta e intimista na cidade de Recife, aqui pertinho de nós. Infelizmente, descobri isso apenas algumas semanas depois de  ser apresentado "musicalmente" a esse formidável trabalho por intermédio de grandes amigos nossos do sul do país. Porém, depois fazer algumas ligações para outros amigos (esses moradores da Veneza Brasileira) descobrimos que todos os ingressos haviam se esgotado, horas depois de anunciado o show (diga-se de passagem, de forma bem modesta e despretensiosa, unicamente através da WEB e redes sociais). Assim, tivemos que desarrumar as malas velhas de guerra, que já estavam quase prontas, achando que pouca gente (ou quase ninguém) conhecia o maravilhoso trabalho do artista paulista (filho de pernambucanos) que lançou no fim do ano passado seu primeiro álbum, "feito pra acabar".
Durante sua infância e adolescência, Jeneci consumia as músicas de Roberto Carlos, Alceu Valença, Jean-Michael Jarre e trilha sonoras de cinema enquanto, paralelamente, observava seu pai consertar instrumentos musicais de artistas como Dominguinhos (que deu a ele seu primeiro acordeon) e outros grandes nomes da música nacional. Aos 17 anos, surgiu a chance excursionar na Europa com a banda de Chico César, uma oportunidade agarrada que o levou para um caminho sem volta. Além dessa experiência, a participação em trabalhos de Arnaldo Antunes, Elza Soares e Vanessa da Mata, para quem ele compôs um de seus grandes sucessos, amadureceu um futuro compositor, que tempos depois, ouvindo o maravilhoso álbum "Ventura" dos Los Hermanos decidiu que deveria  comprar um violão e começar a compor.
Nasceu assim, no final de 2010, " feito pra acabar". Imaginem uma mistura dos sons Arnaldo Antunes, Los Hermanos, Roberto Carlos e tudo que há (ou houve) de bom no então carente e agonizante pop/rock nacional. No entanto, seria muito injusto falar apenas de Jeneci (apesar dele ser o compositor, músico, líder e tudo mais) nesse grande marco musical. Laura Lavieiri é sua parceira musical e canta com seu esplendoroso timbre vocal em várias músicas com o artista, segurando ainda a responsabilidade sozinha com maestria em algumas momentos marcantes do álbum (como é o caso da faixa Longe). Sou suspeito para falar pois prefiro muito mais ouvir músicas com vocais femininos (sejam esses em dupla, docemente inocentes ou liricamente poderosospara esse tipo de estilo musical mas o que essa moça faz abrilhanta ainda o grande trabalho de Jeneci. Tanto que já se cogita que o próximo trabalho terá os nomes dos dois, diante da sintonia de suas performances.
Como diz o título do post, estava começando a achar que nada mais iria empolgar musicalmente em termos nacionais e meus ouvidos vinham vivendo de passado mais do que o Edson Arantes. Ainda bem que a vida sempre nos prega essas peças mostrando como tudo pode ter um recomeço e renovação. Para aqueles que queiram conhecer esse belo trabalho, comecem pelas músicas Felicidade, Café com Leite de Rosas, Pra Sonhar e Dar-te-ei, deixando como a cereja do bolo a última faixa que dá título ao trabalho ... "Feito pra Acabar"

Se o mundo estiver acabando um dia, vou querer ir embora ouvindo essa canção ... Perfeita.

sábado, 27 de agosto de 2011

Viagem ao Centro da Terra

É parafraseando Júlio Verne que inicio esse post por conta de um acontecimento que já considero um marco na história de nossa cidade. No início desse mês de agosto, caiu o forte movimento de resistência  por conta do projeto do VLT e a famosíssima Feira do Rato foi destruída pela SMCCU, um órgão de nossa prefeitura que tem em parte de sua sigla o termo "Convívio Urbano", mas precisa rotineiramente executar tantas tarefas ingratas,  contra principalmente, uma das atividades mais humildes, representativas e perseguidas do país: os vendedores ambulantes.

Tudo bem. Eles não pagam impostos como os comerciantes regularizados, mas já existem leis e iniciativas para tentar resolver essa situação no país da tributação. No entanto, o profissional carinhosamente chamado por muitos de "camelô", além de movimentar boa parte da economia brasileira, traz consigo algo ainda mais forte: São altamente folclóricos e caricatos, inventando bordões e fornecendo produtos financeiramente muito mais próximos do alcance das camadas populares. No caso da Feira do Rato o impacto de sua extinção é ainda mais doloroso, uma vez que além dos seus vendedores e clientes, a feira por si só tinha um carisma próprio e único,  influenciando até no tráfego naquele trecho da cidade. Era fantástico observar quando, boa parte das mercadorias lá comercializadas e postas para venda no meio dos trilhos do trem que cruzava o lugar precisava ser ajustada ao sinal da chegada do esfumaçante, suado e decadente meio de transporte. Apesar do eterno perigo e da milimétrica distância entre trilhos e barracas, que beijavam a porta dos vagões a cada uma de suas passagens, o ritual de arrumação e desarrumação de cada um dos kits de venda nesses instantes sempre dava certo e também era algo que já poderia ter sido tombado como patrimônio imaterial de nosso Estado. 

Além desse aspecto peculiar, posso falar ainda mais e com muita propriedade sobre a Feira do Rato. Nasci, cresci, morei e estudei por muitos anos na fronteira entre os bairros da Ponta Grossa e Levada, lugares na periferia de Maceió. Durante o primário e o ginásio fazia todo dia o caminho de casa até a escola passando pelo efervescente shopping popular. Depois da aula, encarava a entrada no Core, no núcleo e âmago da Feira do Rato protegido, assim como Frodo, apenas pela minha inocência dos inúmeros perigos que me cercavam. Tudo em nome de minha paixão pela leitura, já que lá dentro, no meio da bagaceira, tinha uma banca de revistas velhas que adorava visitar para ler, vender, comprar ou trocar revistas em quadrinhos. Uma de minhas grandes paixões até hoje e que serviram de base para minha veia literária. 

É o fim da Feira do Rato. De suas peças para eletrônicos fora de linha, de seus relógios de origem duvidosa e acessórios "importados", das vendas dos clássicos espelhos de armação cor de laranja e pentes aredondados que cabem na palma das mãos. As roupas de confecção genérica que imitam grifes famosas vão agora para outra boutique  em céu aberto e a Vigilância Sanitária terá outras barracas de passaporte para fiscalizar. Chega o fim de mais um cenário tão brasileiro e colorido como um tecido de chita.  Um lugar que dinamicamente se revestia todos os dias de tantos ritmos musicais, quase sempre capitaneados pelo som politizadotransgressor romântico da Reggae Music ou simplesmente pelo trabalho de artistas tão desconhecidos como tantos rostos que por lá viveram e passaram.

E que venha o VLT ... com sua velocidade e gelidez combinando com uma era onde tudo tem que passar cada vez mais rápido porque todos tem sempre pressa ... muita pressa.
Só não sei mesmo porquê ... mas fica aqui a nossa homenagem

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Superior ao Tempo.

Verão de uma madrugada vazia e silenciosa na enluarada e solitária Avenida Fernandes Lima. Um dos lugares mais congestionados, barulhentos e atormentados da cidade vivia repetidamente, na estreita faixa da meia noite à alvorada, um cenário bem diferente de sua rotina comercial. O cair de uma gilete no banheiro de qualquer um dos moradores da Pitanguinha (que bem podiam estar fazendo uma de suas famosas serestas) poderia ser ouvido por qualquer um de nós que vivesse o dia-a-dia do serviço militar e estivesse "de plantão" naquele dia, no 59º Batalhão de Infantaria Motorizado.

Em dias como esses, ficávamos 24 horas sem poder sair do quartel revezando nossos postos com outros dois companheiros numa escala 2 por 6. Ou seja, duas de guarda e quatro de pseudo descanso (pseudo porque as vezes nossos superiores imediatos usavam essas horas para nos solicitar faxinas e outras atividades de natureza educativa). Fui infeliz no sorteio e caí mais uma vez no famoso turno de 02:00 às 04:00 da manhã. Carinhosamente chamado de "Poca Olho". Além do inseparável Fuzil, ninguém mais para acompanhar nossa jornada solitária de trabalho junto com nossos pensamentos fora de foco da adolescência. Como não estávamos no Iraque, Afeganistão ou qualquer outro lugar de natureza beligerante, a lista de preocupações e coisas para fazer, além ficar atendo ao seu posto, diminuía consideravelmente e assim,  estratégias para o tempo passar mais rápido tinham que ser criadas. Tanto a nobre ciência da Astronomia amadora como outras atividades mais alternativas tinham seu espaço: Contar a quantidade de folhas das amendoeiras que caíam ao chão por minuto, observar quais companhias de ônibus tinham mais veículos passando naquele horário e identificar o intervalo de segundos entre o acender e apagar nas lâmpadas de postes com defeito eram alguns exemplos técnicas para alimentar o ócio.

O coturno sujo, gasto e cansado me pedia a cada segundo para continuar caminhando, mesmo que fosse em círculos, no pequeno espaço físico que tinha que tomar conta naquela madrugada de vigília. Era melhor que ficar parado e acabar encontrando Sandman. As pernas também já não respondiam mais tão rápido àquela altura da semana, depois de uma marcha de 100km na semana anterior e as tradicionais atividades físicas do cotidiano quando,  nos fins de tarde, corríamos pelo bairro do Farol subindo a Ladeira da Moenda sem parar de cantar as músicas mais pedidas por nossas groupies, que adoravam ver alguém de farda fazendo o que quer que fosse. Farda essa, com várias versões de acordo com a ocasião e necessidade: uniforme de gala, de educação física e vários outros. Naquele momento, usava a versão mais comum, com suas cores rajadas e acessórios que me ajudavam a controlar a fome e minha hipoglicemia por conta de seus bolsos profundos na calça que comportavam um pão francês amanhecido de cada lado e mais um punhado de bananolas (que em nossa época eram moeda de troca como cigarros nos filmes de penitenciária) para  passar por mais um dia de trabalho com sentimento de dever cumprido.

Muitos dizem que nas situações de dificuldade, conhecemos as pessoas e lá conheci muito da vida e muitos bons amigos. Perdi o contato com a maioria deles mas queria que soubessem, que nesse 25 de agosto, dia do soldado, apesar de não termos servido nesse posto, lembrei daquele tempo.
Um grande abraço pra vocês ... Até a próxima.

domingo, 21 de agosto de 2011

Projeções de um Cinéfilo

E começa o filme ...
Cadeiras com lugar marcado, encostos reclináveis e braços com porta-copos que nem sempre comportam os recipientes de refrigerante com mais líquido que meu  tanque de combustível . Para complementar o saudável cardápio, os combos de pipoca de proporções maiores que  meus baldes para estocar água nos dias de lavagem da caixa d'água do prédio. O Campo de visão agora é outro: limpo, claro e totalmente inalterado pelas grandes cabeças dos também pescoçudos que outrora sentavam na nossa frente, chegando minutos antes do filme começar. A acústica impecável, que não mais permite a intromissão dos acordes na praça da alimentação logo ao lado (uma vez tive que assistir Gladiador com MPB ao fundo) e a iluminação planejada que ambienta um clima finalizado por maravilhosas telas gigantes com projeções 3D para ver as legendas saindo do filme ou uma borboleta voando em nossa direção de vez em quando.

A experiência de ir ver um filme mudou muito com o passar dos anos e a chegada das super salas de cinema, que hoje funcionam nos shopping centers que odiamos amar tanto trazem uma falsa impressão de que não falta mais nada para a experiência de um cinéfilo ser inesquecível. No entanto, mesmo com tantas mudanças e evoluções tecnológicas, parece que algo ainda ficou faltando. O que será? Bons filmes? Às vezes sim, mas talvez não apenas isso. Há mais de vinte anos atrás existiam apenas, no lugar dessas fantásticas salas de entretenimento de hoje, os cinemas de rua com seus diversos tipos de salas de projeção caracterizadas, basicamente, em três tipos:
  • As Clássicas: Normalmente nos centro das cidades e funcionando em prédios imponentes que hoje deram lugar a bingos ou espaços religiosos e projetavam cada película como museus ostentando suas obras de arte. Recebiam seu público como espectadores de uma peça de teatro, com românticas cortinas cheias de mofo imperceptíveis a distância para misteriosamente esconder suas telas junto a um primeiro andar forrado de camurça vermelha numa frustrada tentativa de elegância que descia por terra quando as luzes se apagavam. O público que normalmente ocupava esse espaço era formado por pré-adolescentes exaltados, responsáveis por vários objetos não identificados que voavam nas cabeças daqueles do andar de baixo no apagar das luzes.
  • As Descoladas: Salas menores em lugares menos populares para a exibição de filmes de arte, documentários, propostas mais ousadas como o Corujão ou apenas aquelas obras de menor apelo comercial. Espaços muito aconchegantes e cheios de estilo que parecem nos transportar no tempo para várias décadas atrás, dando ao público uma sensação de ser muito especial. 
  • As XXX-Rated: Salas mais barra pesada, localizadas normalmente em bairros mais humildes e coincidentemente em frente a pontos de ônibus. Além de filmes pornográficos dos mais diversos tipos e com a maior variedade de espécies envolvidas nas cenas, exibindo também  películas com outro tipo de ação, como as de lutas marciais ou aquelas sem qualquer tipo de trama, repletas apenas de tiroteios que já começavam segundos após seu início e que poderiam até se estender para depois do programa do lado de fora, dependendo do horário que terminasse a sessão.
Hoje, poucos cinemas de rua ainda sobrevivem  e a tendência é que não mais existam ,com o passar dos anos. Para mim, o que mais vai deixar saudade é a sensação que estes proporcionavam ao entrarmos e sairmos de seus domínios. As filas dobrando as esquinas sempre vão me remeter à década de 80 e os sucessos dos Trapalhões ou qualquer nova obra que Spielberg lançava nas férias de julho. Já quando tudo terminava e as luzes se acendiam, a fabulosa sensação de deixar as quatro paredes  para encarar o vento no rosto, o entardecer e as primeiras estrelas no céu. Era uma sensação de continuidade da história, só que agora com outros atores e um novo cenário: Nós mesmos e nossas vidas ... com um pouco mais de magia.

sábado, 30 de julho de 2011

Dando Outro Sentido aos Sentidos

Para quê servem os nossos sentidos?
Sobrevivência. Certamente uma das respostas para a pergunta.
No entanto, existe uma função para os mesmos que todos já devem ter usado alguma vez, mas talvez nunca tenham parado para entender. Complicado? Nem tanto assim.
Em dias de chuva como hoje, por exemplo, o cheiro da água que cai nas cidades de asfalto não me traz a mesma sensação já relatada num post anterior desse blog. E existe um motivo pra isso.

Acontece que algo em nossa mente associa nossos sentidos a sentimentos, lembranças e momentos de nossa vida e quando isso ocorre da maneira perfeita, fica pra sempre. Exemplos? Vamos lá ... :)
  • Nos estudos: Até hoje o cheiro de um caderno novo me leva de volta à infância para a época da volta às aulas no primário. A timidez atenuada pelo conforto de reencontrar rostos conhecidos ou o receio do primeiro dia em uma escola ou turma nova. No segundo grau, o som do piano de Richard Clayderman que me faz achar até hoje que é o fim ou início do intervalo. Na universidade, a visão de nossas pegadas sobre o chão roxo dos brincos de viúva (ou Jamelão para quem não é daqui) já foi tema de discurso de formatura e as músicas que tocavam no rádinho de pilha do cobrador imortalizaram pra mim uma viagem de 40 minutos de uma época que nunca vai se esquecida.
  • Nos esportes: O apito do árbitro (bem diferente do silvo do guarda de trânsito que só me traz sensações ruins) e a sinfonia do atrito dos tênis deslizando pela quadra. Nosso tato sentindo o peso e a textura da bola e seu barulho característico. Seja quicando, batendo na rede, sendo chutada ou arremessada. A alegria de fazer parte de um time ou defender uma cor com aquele gosto salgado de suor deslizando por nossas têmporas até nossos lábios junto àquele sentimento de fim de batalha e dever cumprido.
  • Nas festas e celebrações: Quem nunca ouviu o termo "a nossa música"? Não é a toa que muitos a chamam da língua universal. Músicas marcaram e marcam época. Retratam décadas, ideologias e sentimentos. Hinos representam nações, canções populares fizeram a revolução, ritmos contagiantes destruíram gerações e carnavais populares e nenhuma banda pode deixar de tocar Roupa Nova no fim das festas. 
Em suma, temos hoje tantas lembranças por causa de nossos sentidos mas podemos observar que todas essas associações foram criadas de forma natural, totalmente inconsciente. Assim, proponho o seguinte: Quer ficar com um sentimento pra sempre em você? Faça uso desse poder:
Ao comprar sua primeira casa, tome um banho com um sabonete que você nunca usou;
Prove uma refeição diferente para comemorar uma promoção ou a passagem no vestibular;
Numa viagem especial, ouça uma música inédita;
Para uma sensação que você não quer esquecer, perpetue esse momento, como se o tivesse colocado em uma garrafa mágica que pode esfregada quando quiser para voltar no tempo.
E você? Tem algo especial armazenado pra sempre por causa desse poder?
Bom ... hora de ir, vamos colocar um sonzinho aqui pra lembrar de nossa última viagem. :)

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Reflexões Lítero-Musicais #1

Nada mais esquizofrênico que Shopping Center. Lugar que amamos odiar adorando, sem muitas vezes saber porque estamos sempre pondo nossos pés por lá. Coisa muito comum e inevitável de acontecer numa cidade cujas opções de lazer se resumem a praia, shopping ou barzinho. No último feriado inclusive, tivemos um prenúncio de fim do mundo, que deixou os habitantes da capital Caeté se sentindo como  personagens de Resident Evil ou Eu Sou a Lenda. Todos os shopping fechados e dia sem sol. Assim, por eliminação, enquanto alguns esperavam o pôr do sol pra interagir com as criaturas da noite a partir do catalizador social universal (ou simplesmente "mé", como diria Antônio Carlos) outros promoviam uma série de suicídios coletivos pela cidade a partir de pontos clássicos para essa opção, como por exemplo nosso querido clássico Edifício Breda.

Voltemos no entanto ao tema principal do post  pois tenho essa mania irritante de  fazer ALT+TAB cerebral e fugir do assunto o tempo todo (esqueçam o comentário se não trabalharem muito com computador mas é que uso muito essa expressão). Nessa semana tivemos a inauguração de um novo complexo de salas de cinema que vem a oferecer mais opções de lazer no que tange a sétima arte por aqui. Esse fato, junto com a estréia do último episódio da saga quase infinita de Harry Potter (que só perde em capítulos para as séries Sexta Feira 13 e Cavaleiros do Zodíaco), acabou populando ainda mais esse que é um dos pontos de encontro mais utilizados pela sociedade atual. Assim, como tive que resolver assuntos por lá, comecei a observar  as características desse bioma e os espécimes que o ocupam, acabando por notar como poderia ser interessante uma reflexão Lítero-musical sobre o tema. Sigamos então ...

O barulho coletivo das multidões se propaga por tetos cada vez mais altos e claros que equilibram a visão claustrofóbica de corredores acelerados, escadas em câmera lenta e o cheiro simultaneamente selvagem e cosmopolita da  junk food  que sintetiza com fidelidade a "limpeza suja" de um shopping center. No entanto, além do som provocado por seus habitantes, podemos também dizer que trilhas sonoras características podem ser detectadas para cada uma das inúmeras áreas desse lugar, como citamos a seguir:
  •  A elegância do Jazz Levemente Nervoso e aparentemente sem sentido dos toaletes para ajudar na fluidez de nossos problemas e que ainda é contraposto com o banho de gato de funcionários de algumas lojas que se aproveitam dos horários de menos pico para revelarem outras funções para as pias e secadores de mão e se sentirem menos destruídos pelo ritmo de trabalho tão Hardcore
  • O infinitesimalmente cruel Punk Rock Infantil dos ambientes frenéticos de Game Station. Ritmo desenvolvido cuidadosamente em laboratório e hoje utilizado mundialmente pelos pais, que fazem seus filhos cada vez mais hiperativos gastarem suas energias como se não houvesse amanhã, para depois dormirem como anjos em casa.
  • As músicas Pop Chiclete Consumista, usadas principalmente em grandes lojas âncora de departamento que tanto hipnotiza  as pessoas fazendo-as mais uma vez abraçar o demônio gastador (sempre acabo falando nele :) ) e enfrentando filas enormes para abandonar velhas peças novas (abarrotadas em casa) por novas peças velhas (em breve nas ruas e vitrines).
  • O Tecno Pseudo Descolado das lojas esportivas e/ou principalmente franquias de venda de óculos escuros (ou eyewear, como eles preferem) que fazem seus vendedores pularem, dar cambalhotas, dançar e sorrir sem parar para os clientes, tentando virar nossos amigos de longa data em segundos e passar a mensagem de que só seremos felizes como eles se comprarmos seus produtos.
Enfim, seriam muitas trilhas sonoras mas devo ficar por aqui pois o objetivo dos textos nesse espaço é nunca ser muito grande e além disso, já está tocando em minha cabeça a música de ir embora. Igual aquela quando o Shopping vai fechar, você já ouviu? Um horror ...  Até  a próxima! :)

sábado, 25 de junho de 2011

A Pequena Gigante Natalia

Dando um tempo nas crônicas urbanas e reflexões, me volto para escrever essa breve reseña sobre a artista cujo som atualmente passa mais tempo nos meus ouvidos. Natalia Lafourcade é uma cantora/compositora/instrumentista mexicana com descendência franco-chilena, jeito e tamanho de criança mas que faz um trabalho de gente grande. Parece até que tem uma orquestra sinfônica na cabeça dessa artista singular cujas músicas, em alguns momentos, me lembram muito em sonoridade, atitude e (principalmente) criatividade, a estupenda islandesa Björk.

Lafourcade já tem 4 álbuns lançados. O primeiro já em carreira solo lançado quando ela tinha acabado de completar 18 anos, o segundo  "Casa" (muito bom por sinal com pitadas de bossa nova, jazz e rock indie) com sua breve banda "La Forquetina" e o terceiro (novamente em carreira solo), altamente experimental, uma vez que "Las Cuatro Estaciones Del Amor" é totalmente instrumental e desafiador aos nossos ouvidos com apenas quatro sinfonias cujos títulos (Verano, Otoño, Invierno e Primavera) parafraseam  a eterna obra de Vivaldi, só que (guardada as devidas proporções) sob o olhar de uma brihante menina mexicana  ao invés da perspectiva Barroca do gênio italiano. Por fim, no ano de 2009, Natália lança o álbum cujo título não gosto muito (Hu Hu Hu) mas é para mim sua obra prima e encontro de sua identidade musical. O conteúdo desse trabalho revela sua ousadia e talento em  pérolas como: Cursis Melodias, Let´s get out (ela canta algumas em inglês com um sotaque carregadíssimo e maravilhoso), Ella es Bonita (a preferida de Agdinha) e a cereja do bolo: Hora de Compartir. A letra, a melodia, a originalidade e o conjunto de tudo nessa canção, como diriam os espanhóis ... me encánta!!!!

O som produzido pelas guitarras, violão, baixo, bateria, percurssões, acordeon e piano, fundidos com o experimentalismo de Vibrafones (sou louco por esse instrumento), clavinetes e backing vocals contagiantes, além da deliciosa sonoridade do idioma español (nas vozes femininas, claro) com letras e atmosfera onírico-mambembe que parecem ter saído de um livro de Lewis Carrol ou dos filmes de Tim Burton produzem uma obra magnífica (talvez de difícil digestão inicialmente, mas apaixonante quando se dá tempo para absorver).  La pequeña Lafourcade é tudo isso e muito mais! O novo CD já está sendo produzido e enquanto isso a vemos participando dos shows de sua colega e compatriota (como tem gente talentosa nesse país! ) Julieta Venegas, a quem eu devo o descobrimento de Natalia, que participou de seu DVD Acústico.

Infelizmente por algum motivo de direitos autorais, dá um pouco de trabalho de ouvir o trabalho de Natália, já que boa parte de seus vídeos no Youtube estão bloqueados pela Sony ou outras entidades do mundo áudio visual não sei por qual motivo. De qualquer forma, seguem os links de duas músicas de seu trabalho mais recente, descrito já nesse post: "Ella es bonita" e "Cursis Melodias", além de um vídeo da música   "Casa" da época de sua banda La Forquetita.
Além disso, para quem está afim de estudar español e quer conhecer um pouco mais a artista, segue uma entrevista com a mesma no site Me Hace Ruido!
Hasta muy pronto amigos! :)

sábado, 11 de junho de 2011

Figuras de nosso Estado #5

O pé de horizonte distorcido pelo mormaço que beija nossas calçadas e pistas de asfalto pela manhã se encontra com as pegadas daquele que finaliza (dessa vez acredito que terminei) nossa série de posts "Figuras de nosso Estado". Afinal, não tinha como fechar esse ciclo* sem esse tributo a Maique Taison!!!!
Sim, muitos o chamam desse jeito por aqui (decidi usar essa grafia coloquial para não haver confusão nas menções que fizer ao xará não menos famoso de Maique) por conta de sua semelhança com o pugilista Norte-Americano Mike Tyson , cuja carreira brilhante nos ringues foi encerrada de forma fatítica e deprimente quando este decidiu se perpetuar com a alcunha de comedor de sushi de orelha em seu último combate contra Evander Holyfield. Esta prática antropofágica, inclusive, é seguida até hoje por alguns de seus colegas de profissão e outras figuras de nosso belíssimo cenário político.
No entanto, nosso objetivo é falar hoje sobre Maique. Algo tão difícil quanto entender o porquê dele estar nesse post, uma vez que ele não se destaca por nenhum talento em especial, como era o caso de cada um dos personagens anteriores da série iniciada nesse BLOG. Maique não canta, não dança, não vende nenhum produto e não faz questão de bater papo nem fazer graça pra ninguém. Maique faz apenas uma coisa: Ele simplesmente ... anda.

Acho que, em ao menos uma das manhãs nas vidas de todos que já tenham passado pelos arredores de nossos bairros praianos, a figura é mais do que conhecida. Ele marcha solitário, com passadas firmes, decididas e cheias de atitude. Fica falando consigo mesmo, balançado a cabeça e resmungando contra seus fantasmas internos. Além disso, os visuais variam bastante. Pode ser tanto o já clássico (e mais adotado) estilo Incrível Hulk (como na foto)  como variações ousadas de acordo com roupas que ele deve descolar nos brechós alternativos da vida.  Já vimos Maique de macacão sem camisa, moleton com um perna só levantada, calça cotton cor de rosa e até mesmo mini-saia por cima de calças apertadas. O penteado também já variou bastante: Moicano (muito antes do Neymar), Máquina 1, Black Power e atualmente Semi-careca com luzes em tom de coco queimado. O mais fantástico é que seus visuais podem até mudar com frequência e fugir de qualquer tipo de padrão comportamental de forma efêmera e esquizofrênica mas sua a postura continua a mesma: Incólume ... Perfeita ... Inquebrável.

O tempo passa rápido. Muito rápido. Rápido de forma tão lancinante e sofrida que, aos poucos, marcas e cicatrizes podem transparecer, resultantes da constante sobrevivência a tantas intempéries da vida. Só que não estou falando de Maique Taison. Estou falando de muitos de nós. Muitos que têm de tudo mas estão sempre vazios por dentro. Vagando sem rumo, sem idéias próprias e qualquer noção do que deve ser feito da própria existência, identificados apenas pelo seu pobre radar coletivo. As  dúvidas sempre serão muitas, as quedas diversas, as pancadas e desilusões também existirão, mas a certeza nunca deixa de ser uma só: Assim como Maique e o Johnnie do Whisky ... Keep walking.

*Além de vários contratempos que me fizeram abandonar meus posts nesses últimos dias, vivi nesse hiato de postagens um pequeno dilema relacionado à condução do andamento desse BLOG. Adiar o fechamento da série "Figuras de nosso Estado" e voltar para posts sobre outros assuntos que já tratava anteriormente ou finalizar com essa figura que eu ainda queria descrever? O grande problema era que não tinha uma foto sequer de Maique Taison na WEB . Nem Google nem ninguém encontrava sua versão digital e não achava justo publicar esse post sem isso. De repente, quando já estava desistindo e partindo para outr post, consegui essa foto e o projeto voltou.. É isso aí! Além de promover o ato de escrever e de ler, o Capim também assumiu um víes de reportagem investigativa ... tudo em nome da cultura local. :)

domingo, 29 de maio de 2011

Figuras de nosso Estado #4

Caminhar no centro de qualquer cidade é algo que realmente me faz sentir que, de alguma forma, estabeleci alguma conexão com aquele lugar. Talvez essa impressão seja por conta de minhas origens de longas caminhadas pelo centro, muito próximo do local onde cresci e estudei.
Lá temos a calorenta e impiedosa Rua do Sol se contrapondo com a rispidez de suas diversas agências bancárias (quer me torturar? Dá um jeito de me fazer passar 1h em um banco :( )
A embriaguez da Rua das Árvores, antítese da rua anterior, com sua luminosidade natural quase nula, chão tortuoso e aparentemente sempre úmido, que as pessoas sempre atravessam como personagens de um videogame, tentando ultrapassar os obstáculos oferecidos pelas barracas de tempero, raízes, frutas ou discos usados de vinil .
A armadilha em diversas cores das casas de fliperamas em frente à magistral Praça Deodoro, um dos lugares mais barra pesada (já tinha uma veia antropológica na época e uma curiosidade mórbida em ir pra lá ver garotos de minha idade terem suas fichas tomadas pelos maloqueiros da área) para se frequentar na inocente e romântica época pré-crack.
Na Rua Boa Vista, o clima boêmio do Palácio do Chopp (bar em funcionamento desde 1917 cujas mesas já foram ocupadas por personalidades como Graciliano Ramos e Jorge de Lima) e seus vizinhos engraxates, cujo clima se choca paradoxalmente com a proximidade dos sons agelicais da belíssima Igreja do Livramento, cercada por nossas queridas doceiras e seus tabuleiros de bolo de macaxeira, massapuba, pés-de-moleque e outras iguarias de milho.
Por fim, a alegria da Rua do Comércio!!! Independente dos problemas e mesmo sem dinheiro, lugar para andarmos felizes e de mãos dadas com o demônio gastador!!! Vamos comer pastel chinês com catchup doce do China, comprar besteira na banca de revista, olhar vitrines pomposas nos manequins anoréxicos e sem cabeça das lojas de confecção e tomar caldo de cana com salgado sentindo o cheiro dos self-services (excelente técnica utilizada para matar a fome sem gastar muito dinheiro) preparando suas refeições.
Concomitante a esse universo, se tivesse que escolher uma trilha sonora para tudo isso, posso dizer que não existe nada melhor que o som de Edmilson (conhecido por muitos como o cego do pandeiro).  O último personagem (pelo menos por enquanto) da série de figuras históricas tratadas nesse espaço.
Alguém tem noção do que é ficar sentado, sem enxergar, no meio de um sol escaldante (em torno dos 40ºC) tocando seus instrumentos (pandeiro, gaita e lata de leite em pó entre as pernas) e cantando sem microfone o dia todo? E com harmonia? Edmilson é pra mim um dos maiores artistas de rua da cidade. Um talento que já emocionou várias gerações com seus lamentos, cânticos de luta regados a lágrimas misturadas de suor e até mesmo músicas de deboche sobre os políticos locais e outros temas pertinentes da época.
Difícil alguém que já andou pelo centro de Maceió e não saiba de quem eu esteja falando. Não ando mais por lá como antes (uma pena e talvez por isso tenha ficado esses anos sem escrever), mas nas últimas notícias que tive ele ainda estava atuando, como podemos ver nessa matéria de dois anos atrás. Reverencio Edmilson não apenas por motivos folclóricos ou musicais. É algo bem mais profundo ...  envolve uma atmosfera criada em conjunto por diversos artistas na arte de sobreviver, contornada de forma inesquecível por seus versos e melodias. É algo que, uma vez absorvido, fica tatuado na alma pra sempre.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Figuras de nosso Estado #3

Paripueira é um município do litoral norte de Alagoas, situado cerca de 27km da capital. Lugar muito famoso por suas belas praias e período carnavalesco. Essa cidade, cujo nome significa em tupi "águas mansas" é o local de origem de nossa personagem de hoje: A Miss Paripueira, que de mansa não tinha nada.

Apesar do título, Ambrosina Maria da Conceição, falecida há mais de uma década, fez história mesmo na capital. Era em Maceió, mais especificamente no centro comercial da cidade, que sempre a encontrava em suas célebres performances. Em meados da década de 90, antes do divisor de águas causado na indústria fonográfica por conta de Shawn Fanning e seu aplicativo de compartilhamento de arquivos, gostava muito de andar pelo centro (lugar onde a cidade realmente mostra sua cara) e parar nas lojas de CD para garimpar promoções e novos lançamentos de meus artistas favoritos.

Sempre que chegava em alguma de minhas lojas favoritas ela estava lá.A cena era de fechar a rua do comércio. Ficavam todos parados por minutos olhando. Nossa Miss usava óculos enormes, colares e pulseiras coloridas, vestidos estampados e berrantes. Um visual visionário (que deixariam os adoradores do falecido e aclamado Alexander McQueen chocados) com uma atitude pungente e visceral.

Assim que a loja se abria e tocavam a primeira música para chamar a clientela, o som dos primeiros acordes junto com as palmas e gritos de funcionários de outras lojas (que até hoje usam esse recursos para chamar freguês por aqui, como quem tange galinha), fazia ela se danar a dançar ... fervorosamente ... e sem parar. Ela encarava de tudo: Forró, Axé, samba, pagode e até rock n´ roll e outras variações (uma vez pedi pra o atendente da loja mudar o cd e tocar o clássico Nevermind pra ver se ela parava e nada ... ela adorou :) ). Enfim, o que botassem pra moer ela traçava. Somente uma coisa a desconcentrava: Falar mal de seu "noivo" Fernando Collor. A Miss era apaixonada pelo homem e não admitia que ninguém falasse mal de seu amado. Ela literalmente rodava a baiana quando alguém o fazia e sua street dance ganhava ares de balé e luta contra inimigos invisíveis, parecendo até as famosas cenas do genial  Yuen Woo-ping (o coreógrafo chinês que revolucionou o cinem com pérolas como: The Drunk Master, Matrix, Kill Bill e outros clássicos de Jet Li e Jackie Chan)

Hoje nossa miss se foi, não existem mais lojas de CD e muita gente prefere ir ao shopping quando chega para conhecer uma cidade. Peço que continuem indo ao centro, as melhores fontes de inspiração estão por lá. Tanto que nosso próximo post vai falar um pouco mais sobre essa parte da cidade e uma das maiores figuras que lá já surgiu. Até lá. :)

domingo, 22 de maio de 2011

Figuras de nosso Estado #2

Saímos das linhas do trem, nas imediações do Mercado da Produção, para os típicos bares e restaurantes de nossa cidade, onde corremos para um dedo de prosa e apreciar a divina culinária local. Qualquer um que mora (ou já passou) por aqui já chegou a ver, ao menos uma vez, o personagem do post de hoje. Luis Eudes da Silva: o Rei do Suspiro.
Ao contrário do personagem do post anterior, não considero esse seu nome artístico tão legal. No entanto, parece ser o oficial pois foi o título que encontrei em dois sites jornalísticos locais sobre o mesmo. Só vi essas matérias um dia desses na WEB, quando decidi pesquisar para o post só que muito antes disso já admirava o trabalho daquele que chamava de "Nêgo do Suspiro". Achava essa alcunha muito mais enigmática e adequada ao personagem. Misterioso, educado, nunca faz alarde ao chegar, não usa microfone, bastante discreto (sinceramente, não consigo lembrar de alguma vez já ter ouvido sua voz) , sempre de terno e gravata e o mais importante: Possui o poder da onipresença.
É impressionante como ele está em todo lugar da cidade e já ultrapassou às fronteiras dos ambientes envolvidos apenas com a culinária. Perdi as contas de palestras, fóruns, congressos e outros eventos que acontecem por aqui e o encontro fazendo sucesso e vendendo seus suspiros e broas.
Para mim, poderia ser muito bem um dos personagem de Monteiro Lobato. Nunca o vi rindo, fazendo piada, nem se exibindo mas o fato é que, quando menos esperamos ele simplesmente está lá. Talvez seja por isso que minha esposa morra de medo da figura e fica agoniada quando ele aparece (quem conhece Agda deve estar se divertindo ao imaginar isso mas ela tem medo mesmo e toda vez que o vê me diz: "Mô, vamo embora! Ele chegou!!! ") durante nossos almoços nos fins de semana. Realmente, o título que imaginei para o personagem pode até parecer mais literário mas creio que não seria muito bom para os negócios. Até o próximo post. :)

sábado, 21 de maio de 2011

Figuras de nosso Estado #1

Pregoeiros são aqueles vendedores (de fruta, doce ou algum outro tipo de produto ou serviço fabricado/prestado de forma altamente amadora) que promovem sua estratégia de marketing e executam suas vendas de maneira única. Eles fazem algo tão genial que sua imagem acaba se tornando algo muito maior do que o que estão vendendo. Vou começar essa série de posts sobre folclore com um dos pregoeiros mais marcantes de nossa cidade até hoje: "O Galego do Veneno".
Genésio Rodrigues dos Santos trabalha há mais de 50 anos vendendo seus "venenos" sentado de maneira confortável e debochada, protegido do sol por uma sombrinha e falando o tempo todo ao microfone sua célebre frase: "Queeeeem quer veneno?"
A partir desse bordão, ele emenda outras pérolas como: "Façam fila, por favor!!!" , "Tem veneno pra todo mundo" e outras tiradas que dêem a entender que o negócio está bombando . No entanto, o fato é que nunca tem fila nenhuma pra comprar veneno e muita gente chega a dizer que os produtos vendidos não eram apenas aqueles anunciados pelo Galego, usados apenas para matar ratos, baratas e outros animais peçonhentos.
Sua imagem na rua do Mercado da Produção, ao lado dos trilhos do trem, já rodou o mundo e acredito que muitos lugares no mundo têm figuras assim  para animar nossos dias e trazer inspirações que se concretizem nos mais diversos tipos de manifestação cultural.
Como fui um privilegiado em minha infância, adolescência e mesmo até hoje ainda convivo com um grande número de personalidades desse naipe, devo seguir com outros posts sobre outras figuras parecidas em breve.

OBS: Queria deixar um link para um BLOG bem legal onde achei referências para esse post (incluindo a foto). O BLOG da Thay é um espaço super rico em referências sobre nosso Estado de cunho jornalístico e antropológico.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Cúmulos, crônicas e conexões

“Atenção srs passageiros do vôo 5832  com destino a Belo horizonte e demais conexões.  Dirijam-se imediatamente ao portão de nº 9. Passagem preferencial para idosos, gestantes, pessoas com crianças de colo e portadores de cartão de fidelidade mega master golden plus”
Ao ouvir essa chamada em nosso portão de embarque e verificar que ainda não era nosso vôo e que sequer tinham começado a chamar os passageiros de nossa “categoria” , decidi que o melhor a fazer era continuar observando a vida dos outros e começar a escrever para passar o tempo.

Na sala de espera, a equipe de comissários e aeromoças ainda estava na fase intermediária do que chamo de “metamorfose aérea”. Adoro observar como eles ficam descontraídos conversando entre seus colegas da mesma espécie. Contam piadas, falam gírias,  alguns com cara de saco cheio, outros olhando torpedos no celular (já vi até uma comissária tirando catôta uma vez ... juro) e de repente, quando nos recebem no avião se transformam. Aquele sorriso esticado no melhor estilo coringa (Why ... so ... serious!!!! :D) e usando palavras educadas o tempo todo. Pedem desculpa até se você pisar do pé deles. Das duas uma: Ou entram numa espécie de transe ou ficam pensando o tempo todo em algum mantra para ter que agüentar tanto dejavu . De tudo o que acontece todo santo dia de expediente pra eles, nada deve mudar. Até mesmo os passageiros, que apesar de serem pessoas diferentes se comportam da mesma forma: Não estão nem aí para a fivela do cinto ou para o assento flutuante. Só querem chegar mais rápido em casa depois de comer muito confeito ou amendoins acompanhados de turbulências aterradoras e intermitentes.

“Srs passageiros do vôo 5832 com destino à Belo Horizonte e demais conexões. Dirijam-se ao portão 9.”

O Piloto é um caso a parte. Tanto que raramente consigo observá-lo no meio do resto do grupo antes de entrar na aeronave. É a estrela da turma. Consegue ser ainda mais curioso que todos os outros. Como uma pessoa consegue pilotar um avião e não sabe dar um aviso em inglês? Ou será que de sacanagem ele enche a boca de sucrilho e farinha e aposta com o co-piloto algum recorde de como falar cada vez mais rápido os avisos de sempre?

“Srs passageiros, última chamada para o vôo 5832 com destino à Belo Horizonte e demais conexões. Dirijam-se ao portão 9.”

Última chamada ... Era a quinta vez (nas minhas contas) que diziam isso. Incrível como brasileiro tem a cultura de não ser pontual. Mais incrível ainda como incentivam isso, pois observava os funcionários da empresa aérea aperreados falando: “Ainda faltam 16 ... 16!!!  Vou ver se acho mais alguém”. Fala de novo aí no som. Aí entra em cena o cara da voz: Um infeliz magrinho e tão baixo que quase subia no mic entoando um vozeirão totalmente desproporcional às suas dimensões. Um próprio Pavarotti (já observei que isso é bem comum tmb pois tinha na infância a mania de procurar o cara do supermercado que ficava anunciando as liquidações e sempre me decepcionar ao encontrá-lo e ver que não era parecido com o Elvis).

“Srs passageiros, última chamada para o vôo 5832 com destino à Belo Horizonte e demais conexões. Dirijam-se ao portão 9. Tô falando sério! Não vou chamar mais não!!!”


Enfim, vou terminar por aqui pois já estou tão cansado que nem sei mais se estou sonhando ou ouvindo o cara do som já com mais uma mensagem. Onde é que isso vai parar?

OBS : Inspirado por Alain de Botton, já que deixei (de forma proposital) para ler o último capítulo no livro (cujo título é “A Partida”) no fim de viagem, pedi para usar uma foto que Agda tirou com seu celular para ilustrar esse post. Ficou parecidíssima com a capa do livro.  Massa Não? Até o próximo post.

domingo, 8 de maio de 2011

Livro do mês: Maio

Chegamos ao mês das mães, das noivas e de tentarem nos induzir pelas propagandas e tendências capitalistas para gastar com presentes, festas e outras formas de manifestação do demônio gastador :) (minha esposa e amigas adoram essa expressão criada por um primo meu) . No entanto, essa é uma das piores épocas (pelo menos para mim) para conseguir gastar com o que mais me faz bem: Viajar.
Maio quase não tem feriados (e nesse ano o único foi num domingo) e nunca dá pra tirar férias e assim, para que possa exercer essa atividade que tanto me faz bem, decidi mergulhar na (inicialmente) difícil leitura do filósofo-escritor Alain de Botton e uma de suas mais famosas obras, uma vez que o autor tem várias outras publicações sobre os mais diversos assuntos (muitos deles aparentemente banais mas que podem nos levar a maravilhosas infinitas divagações sobre nossas vidas).
Em "A Arte de Viajar", De Botton criou uma obra única (pelo menos para mim e até o momento em meu curtíssimo portfólio de livros lidos) tanto quanto a forma de escrever (altamente reflexiva) como na forma que foram estruturados os capítulos e partes do livro. Foi uma sacada conceitual fantástica onde são fragmentadas as principais etapas e características de uma viagem (partida, aeroportos, postos de gasolina, hotéis,  paisagens, retorno,...) e cada uma dessas partes/capítulos tem um "guia" que compartilha esse amor pelas viagens junto com o autor, descrevendo várias partes do mundo que deveríamos conhecer através da suas óticas, ideais e profusão de sentimentos.
Lendo "A Arte de Viajar" aprendemos história, geografia, arte e ainda conhecemos melhor  (ou até descobrimos) a vida de personalidades fantásticas como Baudelaire e seus brilhantes e revoltados textos, Edward Hopper e suas pinturas introspectivas sobre solidão na multidão, William Wordsworth e o dualismo Cidade-Campo refletido em nossa qualidade de vida, o expressionismo de Van Gogh e várias outras coisas que vão fazer qualquer leitor relevar sobre suas prioridades na vida.
Enfim, estou devendo a alegria de ler esse livro à minha amiga Giovana, que deu a dica. Vou ter que economizar mais ainda pra comprar outras obras do autor enquanto não chega a hora de partirmos para nossa próxima viagem, que não está longe ...  É melhor ir arrumando as malas! :)

domingo, 1 de maio de 2011

Chuva no meio fio ...


Fiquei sem sono nessa madrugada ... Acho que por causa da chuva.
Entidade essa que me provoca diversos sentimentos desde criança, como por exemplo:

Medo - Qualquer chuva pesada como essas que estamos tendo agora na cidade, me faziam perder o sono na época que morávamos em nossa saudosa casa na Ponta grossa, que só tinha um defeito: Ser situada em um local onde quase todas as habitações ficavam cheias de água no inverno ou nas chuvas de verão. Água nas canelas dentro de casa é uma sensação que não desejo pra ninguém. :(

Paixão -  Sempre adorava jogar futebol na chuva quando criança. Achava altamente poético e heróico. Principalmente quando marcava algum gol ou ficava de goleiro e tinha um dia iluminado pegando toda bola  que viesse. Seja ela canarinho, dente de leite ou qualquer outra marca de acordo com a fase vivida. :)

Ódio - A cidade para quando chove. Falta energia, ruas ficam intransitáveis, lama por toda parte e chegamos todos molhados no trabalho e sem saber o que fazer com uma das peças mais complexas de se gerenciar já inventada pelo ser humano: o guarda-chuva.

Paz de espírito - O balançar das folhas, galhos e o cheiro que a chuva provoca em lugares com o chão de terra e paisagens muito verdes é algo indescritível. Um verdadeiro tranquilizante natural que me leva pra bem longe dos meus problemas

Embaraço- Sou péssimo em trabalhos manuais. Assim como algumas de minhas grandes frustrações como não saber desenhar nem tocar qualquer instrumento musical, se pintarem missões como consertar goteira ou qualquer coisa quebrada por causa da chuva, não contem muito comigo.

Catarse- Você já tentou nadar na chuva? É muuuuuuuito bom!. Não o fiz por capricho ou invenção. Simplesmente fiz dois anos de natação em uma piscina semi-olímpica descoberta. Era um dos melhores momentos do meu dia e quando chovia (principalmente se fosse torrencial) ficava melhor ainda. Não entendia porque alguns saíam de suas raias. Já estávamos molhados mesmo. :)

Enfim, poderia ficar eternamente aqui entre tantos sentimentos por várias linhas de texto. O fato é que, como não moro em uma cidade com as 4 estações do ano não posso escrever sobre os tipos de cristais dos flocos de neve, sobre as folhas secas e vermelhas do outono nem muito menos sobre o desabrochar da acácia japonesa.

Vivemos em uma cidade como apenas duas estações no ano: "Sol escaldante" e "Chuva de lascar". A transição entre as duas é bem tênue e às vezes estas se alternam tão matreiramente que nem dá pra saber em que mês estamos ... hum está estiando ... posso voltar a dormir de novo ... por enquanto.

domingo, 24 de abril de 2011

Isobel & Mark

Faz tempo que sou muito fã do trabalho dos britânicos do Belle and Sebastian. Na verdade eles mereciam um post antes mesmo desse mas o fato (coincidência ou não) é que a fase dessa banda que mais adorava era justamente o período (1996-2002) que a escocesa Isobel Campbell contribuiu (os álbuns TigerMilk e When you´re feeling sinister são os meus favoritos) com seu violoncelo e maravilhoso timbre de voz. Depois de deixar o B&S, ela partiu para alguns trabalhos solo (que ainda vou falar por aqui) mas o que mais me enlouqueceu foi o resultado de uma parceria inusitada.

Isobel uniu suas delicadas cordas vocais com o vocal soturno (graças à genética e provavelmente muitas tragadas de cigarro. Taí uma boa utilidade para o tabaco :) ) de Mark Lanegan, ex vocalista da não tão conhecida banda grunge Screaming Trees. O resultado deu tão certo que eles já tem três trabalhos juntos (Ballad of the Broken Seas, Sunday at Devil Dirt e mais recentemente o álbum Hawk em 2010). A sonoridade dos álbuns da dupla é bem variada, passando pelos raízes norte-americanas do country, folk, blues e jazz (por conta de Lanegan) com um violão grave, pesado e agradabilíssimo aos ouvidos se fundindo à formação clássica de Isobel com suas composições e melodias maravilhosas com piano, violino, violoncelo, flauta e tantos outros instrumentos que fazem parte de sua cultura musical.

A fórmula "Bela e a Fera" não é nova. Lembro como eu adorava "Candy" com Iggy Pop e Katie Person do B-52s e como amava ainda mais (ainda amo mas fazia tempo que não ouvia) a música Where the Wild Roses Grow com Nick Cave e Kylie Minogue num outro dueto maravilhoso para o brilhante trabalho: Murder Ballads. Só que esse "casamento" de Isobel e Lanegan é que mais me preenche a alma no momento. Sabe uma coisa que te faz bem em ouvir? Que te dá paz? E outra ... o álbum combina muito com uma trilha para pegar a estrada. Como estamos planejando fazer isso em breve, já dá pra irmos ensaiando o clima ao som da dupla.

Para aqueles que se interessaram, recomendo que comecem ouvindo esse som por: Who Built the Road do segundo álbum da dupla: Sunday at Devil Dirt e depois sigam ouvindo todo o resto com calma, digerindo sem pressa. É um som arrebatador.
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